Nesta vida sabemos apenas em parte e, de fato, quanto mais aprendo, mais vejo que não sei. Mas também acredito que Deus nos conhece completamente e que, em nossa incerteza, podemos aceitar o amor de Deus por nós como certo e constante.
Pretendemos modificar a tradução se for necessário. Para dar sugestões, envie um e-mail para: speeches.por@byu.edu
Levei muito tempo para escrever este discurso de devocional. Às vezes, quando tenho a oportunidade de fazer um discurso ou dar uma aula, sei imediatamente sobre o que quero falar. Isso aconteceu há alguns meses em minha ala. O bispo veio à minha porta e perguntou se eu estaria disposto a falar no domingo seguinte, e eu imediatamente soube sobre o que queria falar. Quando me sentei para escrever aquele discurso, parecia que ele tinha se escrito sozinho.
Este devocional foi muito diferente. Desde o momento em que me pediram para falar, senti-me atormentado pela incerteza sobre o que dizer. Dois meses depois, eu tinha escrito e descartado páginas e páginas de rascunhos e pensamentos semiformados. Eu não sabia o que o Senhor queria que eu lhes dissesse hoje. Não sabia o que eu queria lhes dizer hoje.
Então, finalmente, uma semana antes de ter que enviar o texto do meu discurso, aceitei que talvez o que eu precisasse falar hoje fosse sobre não saber.
Talvez seja estranho dizer isso, já que cresci em uma igreja que encoraja os membros desde muito jovens a dizer as palavras “Eu sei”, mas o que tenho mais certeza nesta vida é que não sabemos todas as coisas. Na verdade, na grande escala de toda a verdade, é bem possível que, estatisticamente falando, não saibamos nada. E com isso quero dizer que, porque Deus e a verdade são tão vastos e tão grandes, as coisas que sabemos são tão pequenas em comparação que tornam esse conhecimento essencialmente inexistente. Então, hoje quero falar sobre essa ideia de não saber e sobre encontrar Deus em nossa incerteza.
Quero acrescentar esta advertência: Falo a partir da minha própria percepção e experiência. Paulo, em sua epístola aos coríntios, falou sobre dons espirituais — os dons da sabedoria, do conhecimento, da fé e da cura.1 Confesso abertamente que provavelmente não me foi dado o dom do conhecimento. Às vezes em minha vida, tive fé e esperança, mas, em geral, meu conhecimento muitas vezes pareceu um pouco tênue. No entanto, passei a acreditar que a incerteza pode ser uma dádiva tanto quanto o conhecimento, por isso vou conversar com vocês hoje com esse espírito de incerteza.
Gostaria de discutir vários aspectos do não saber. Minha esperança é que em pelo menos uma delas vocês encontrem algo útil ou de valor para viver, frequentar a escola, desenvolver seu testemunho, construir relacionamentos e sair pelo mundo para fazer o que quer que vocês façam nesta Terra.
Há maneiras diferentes de saber
Primeiro, acho que é útil falar um pouco sobre o conhecimento em si. Usamos a expressão “eu sei” de muitas maneiras, mas elas não são todas iguais. Considerem as declarações seguintes:
1. Eu sei que 2 + 3 = 5.
2. Eu sei que em um dia claro, o céu é azul.
3. Eu sei que amo meus pais.
Todas essas declarações usam a frase “eu sei”, mas a maneira como conheço cada uma dessas coisas não é a mesma. Vejam a primeira declaração. Esta é fácil para mim como professora de matemática. Se eu pegar dois objetos distintos, M&M’s por exemplo, e combiná-los com mais três M&M’s, terei cinco M&M’s. Embora eu tenha reconhecido que a verdade em matemática é muito mais complexa do que costumamos imaginar, é no entanto muito difícil contestar a declaração de que 2 + 3 = 5.
Mas agora considerem a segunda declaração: o céu é azul. Na superfície, parece igualmente indiscutível. Creio que todos concordarão comigo que, num dia claro, o céu fica azul. Mas não sei se quando olhamos para o céu todos vemos a mesma coisa. E se uma pessoa é incapaz de ver o céu, o que significa que o céu é azul? Cientificamente podemos falar de luz e comprimentos de onda, mas isso não reflete minha experiência de ver azul. Na verdade, aprendi recentemente que as línguas antigas não tinham uma palavra para azul e que, na falta de uma palavra para descrever a cor, as pessoas que falavam essas línguas podem ter sido incapazes de sequer ver a cor azul. Para explorar essa possibilidade, o pesquisador Guy Deutscher decidiu fazer o que inúmeros pesquisadores já fizeram: ele experimentou em sua própria filha. Quando sua filha era muito jovem, ele tinha o cuidado de nunca descrever a cor do céu para ela. Finalmente, um dia ele pediu que ela olhasse para cima e descrevesse a cor, mas ela não tinha ideia de como descrevê-la. A princípio, o céu não se encaixava em nenhuma ideia de cor para ela..2
Isso complica a verdade da minha declaração de que o céu é azul.
Quando considero a terceira declaração, de que sei que amo meus pais, tenho que admitir que não há uma maneira objetiva de medir isso. Na verdade, falhei vergonhosamente em algumas medidas simples de amor. No ano passado, quando meu pai me ligou no aniversário dele, eu nem disse feliz aniversário para ele! Ainda assim, posso dizer que sei com 100% de certeza que amo meus pais e realmente acredito que eles sabem o mesmo. É apenas um tipo diferente de conhecimento do que o conhecimento que 2 + 3 = 5.
Quando se trata de assuntos relacionados ao Espírito, frequentemente ouvimos as palavras “eu sei”:
- Eu sei que a igreja é verdadeira.
- Eu sei que Jesus me ama.
- Eu sei que a obediência traz bênçãos.
Acho que às vezes presumimos que qualquer declaração de “eu sei” precisa significar “eu sei” da mesma forma que eu sei que 2 + 3 = 5. Mas não podemos saber essas coisas da mesma maneira, porque são tipos diferentes de verdade e estão acessíveis a nós de maneiras diferentes. O que eu acho que geralmente queremos dizer é que estamos igualmente confiantes nessas coisas. Mesmo assim, alguns de nós estamos e outros não. Nem todos recebemos o dom do conhecimento.
Creio que é importante entender o tipo de conhecimento que devemos buscar. Conhecimento de que 2 + 3 = 5 é bastante definido, mas o conhecimento sobre a cor do céu nasce de nossa experiência com o céu. Não apenas a cor do céu está sempre mudando, mas, à medida que ganhamos experiência, nossa capacidade de descrever o que estamos vendo e até mesmo nossa própria capacidade de ver podem mudar e crescer — assim como nossa capacidade de conhecer a Deus pode mudar e crescer ao longo de nossa vida. Se eu presumir que conhecer a Deus é como saber que 2 + 3 = 5 e então eu vivencio algo que entra em conflito com meu entendimento, eu tenho que voltar à prancheta com toda a aritmética. Mas se conhecer a Deus é mais como conhecer a cor do céu, conflitos aparentes com meu entendimento atual têm o potencial de expandir em vez de destruir minha visão.
O conhecimento das coisas espirituais também se manifesta em como esse conhecimento orienta nossas ações. É muito menos importante saber que amo meus pais do que demonstrar esse amor por eles e continuar tentando mesmo quando minhas expressões são imperfeitas. O conhecimento de que a Igreja é verdadeira, de que Deus vive ou de que Jesus nos ama é menos importante do que o que nossa fé e esperança nos obrigam a fazer. O conhecimento do amor de Deus é importante, mas como aceito esse amor e permito que ele mude a mim mesmo e ao mundo ao meu redor, mesmo quando meus esforços são imperfeitos, é muito mais importante.
Um conhecimento completo e seguro também pode ser limitante e, honestamente, não to interessante. Um conhecimento vivo que muda, cresce, se adapta e nos motiva para a ação é um conhecimento que abraça estados de incerteza e de não saber. Estes estados nos levam à mudança e ao crescimento. Na verdade, como seres humanos, tendemos a passar rapidamente de fatos simples como 2 + 3 = 5 para questões complexas do que podemos fazer com esses fatos e, em seguida, para perguntas que estendem nossa compreensão além de seus limites aparentes. A matemática é muito maior e muito mais aberta do que 2 + 3 = 5, assim como Deus é muito maior do que imaginamos.
Às vezes estamos errados sobre o que sabemos
Quero seguir em outra direção agora e abordar outro lado do não saber. Gostaria de começar com uma história.
Certo dia, enquanto eu trabalhava nesse discurso do devocional em casa, minha filha de 4 anos estava brincando no sofá ao meu lado. Nosso cachorro Jin latiu para a porta dos fundos, querendo entrar na casa.
“Você pode deixar Jin entrar?” perguntei ao minha filha. Porque para que servem as crianças, a não ser para fazer as pequenas tarefas que você mesmo não tem vontade de fazer?
Mas, em vez de pular com ânimo para ajudar, minha filha me informou: “Jin não latiu”.
“Bem, acabei de ouvi-lo”, disse a ela.
“Jin não está fora”, ela respondeu.
“Bem”, eu disse, “na verdade, estou olhando para a porta e o vejo do lado de fora”.
“Ele não está do lado de fora”, insistiu ela.
Como eu estava trabalhando em um discurso devocional sobre conhecimento, decidi fazer aquela coisa de “experimentar com seus próprios filhos” e perguntei: “Você sabe que Jin não está fora?”
Com grande confiança, ela olhou para mim e disse: “Eu sei que Jin não está fora”.
Nesse momento, levantei-me e deixei nosso cachorro entrar, e minha filha exclamou: “Oh, mamãe, Jin estava do lado de fora!”
Sua aparente surpresa genuína me convenceu de que ela não estava mentindo quando, diante das evidências visuais e auditivas, ela me informou que nosso cachorro não estava realmente latindo do lado de fora para entrar. Acredito que ela realmente sabia que o cachorro não estava do lado de fora porque ela queria que ele não estivesse fora. Teria sido inconveniente para ela se ele estivesse fora, porque ela teria que parar de brincar e deixá-lo entrar.
É uma anedota engraçada quando se trata da minha filha teimosa e determinada, mas fazemos isso o tempo todo. Quando sabemos algo, é provável que nos agarremos a esse conhecimento o mais firmemente que pudermos, mesmo quando estamos enganados. Geralmente não percebemos que estamos fazendo isso. Claro que não, porque sabemos!
Nossa mente humana é construída para dar sentido ao mundo ao nosso redor, para categorizar, avaliar e colocar nossas experiências e observações em caixas simples. A capacidade de criar ordem e organização a partir do caos que nos rodeia é incrivelmente importante para a nossa sobrevivência e bem-estar. Mas uma consequência dessa capacidade humana bem desenvolvida é que todos nós achamos que sabemos e entendemos muito mais do que realmente sabemos.
Uma das minhas histórias favoritas da história da matemática é a história do postulado das paralelas. Por volta de 300 a.C., Euclides de Alexandria escreveu um livro chamado Os Elementos, no qual ele essencialmente construiu a geometria com base em cinco postulados ou declarações que são aceitos como verdade sem precisar de raciocínio ou argumento adicional. Quatro de seus cinco postulados são bem diretos. Uma delas, por exemplo, foi que, com dois pontos determinados, podemos traçar uma linha reta ligando esses dois pontos. Mas o quinto postulado tem causado problemas aos matemáticos nos últimos dois milênios. Este postulado diz:
Caso uma reta, caindo sobre duas retas, faça os ângulos interiores e do mesmo lado menores do que dois retos, sendo prolongadas as duas retas, ilimitadamente, encontrarem-se no lado no qual estão os menores do que dois retos.3
É um pouco complicado, mas essencialmente esse postulado nos permite acreditar em algumas coisas sobre linhas paralelas, ou linhas que nunca se cruzam, que intuitivamente parecem ser verdadeiras sobre linhas paralelas.
O problema é que os matemáticos não estavam convencidos de que esse conceito era conclusivo. O quinto postulado parecia mais uma ideia sobre o espaço geométrico que precisava ser discutida, do que uma conclusão que poderia ser apresentada sem argumentos. Durante séculos, os matemáticos tentaram encontrar uma maneira de fazer esse argumento usando apenas os quatro primeiros postulados e talvez um novo postulado mais evidente.
Uma pessoa que trabalhou neste problema no início do século XVIII foi Giovanni Girolamo Saccheri. Ele atacou o problema usando quadriláteros e achou que tinha conseguido uma solução. Em sua Proposição XXXIII ele afirmou que um determinado resultado contrário seria “repugnante à natureza da linha reta”.4 Basicamente, Saccheri sabia o que uma linha reta deveria fazer e sabia o que linhas paralelas deveriam fazer. Em última análise, seu argumento para a verdade do postulado paralelo dependia do fato de que, sem ele, as linhas retas acabavam se comportando de maneiras “repugnantes” à sua natureza.
Mas um século depois e mais de dois mil anos depois que Euclides escreveu seu livro Os Elementos, um grupo de matemáticos finalmente perguntou: “E se estivermos errados sobre a natureza das linhas retas? E se em alguns espaços as linhas se comportarem de uma maneira, mas em outros espaços elas se comportarem de uma maneira completamente diferente?”
Ao deixar de seus conhecimentos de lado, eles descobriram algo fascinante: se reconsiderassem a maneira como as linhas paralelas funcionam, a geometria não se desfazia. Na verdade, ao ajustar essa condição, eles conseguiram criar ou talvez descobrir uma geometria estranha, nova e maravilhosa que agora chamamos de geometria hiperbólica, que é matematicamente tão válida quanto a geometria euclidiana que vocês aprenderam no ensino médio, embora seja muito mais difícil para os humanos compreender.
A matemática, quando vocês passam tempo com ela, tem um tipo particular de beleza que nem sempre é bem transmitida em nossas experiências escolares. A geometria hiperbólica tem sua própria beleza, tanto matematicamente quanto visualmente. Mas abrir a porta para essa beleza exigia que os humanos admitissem que o que eles pensavam que sabiam poderia realmente estar errado.
Acho que é importante questionarmos o que achamos saber e nos abrirmos à ideia de que pode ser errado, mesmo (e talvez especialmente) quando estar errado seria inconveniente ou desconfortável para nós. Posso até me perguntar as seguintes perguntas:
- Tenho certeza de que realmente entendo o coração e as intenções de outra pessoa, ou será que minhas próprias experiências tornam difícil para mim entender o que estão pensando?
- Quando discordo de alguém, tenho certeza de que estou certa e eles estão errados, ou posso ter pontos cegos?
- Posso aprender com a perspectiva de outra pessoa?
- Quando a maneira de falar, agir, pensar, adorar, etc. de outra pessoa é desconhecida para mim, tenho certeza de que meu desconforto é a falta do Espírito, ou será que ainda não aprendi a ver Deus naquele ambiente específico?
- Tenho certeza de que tenho pleno entendimento de determinado princípio ou mandamento do evangelho, ou poderia aprender algo ao fazer perguntas ou ouvir as experiências de outra pessoa?
Aceitar que talvez não saibamos o que achamos saber não significa que precisamos abrir mão de toda certeza ou convicção. Em vez disso, a abertura para estar errado pode ser uma posição humilde de fé na qual a “esperança nas coisas que não se veem”5 pode florescer ao nos permitirmos aceitar que há coisas que não são vistas para nós.
O Deus das Coisas Perdidas não responde a todas as perguntas
Finalmente, seria fácil para mim enquadrar o tópico da incerteza como “incerteza até”, com a expectativa de que não saber é apenas um passo no processo para conhecer. Mas, embora possamos obter maior entendimento ao longo de nossa vida, também não há fim para o não saber na mortalidade. Na verdade, haverá muitas vezes em nossa vida em que as respostas não virão e em que o não saber é um estado aparentemente permanente.
Uma das coisas que sempre amei no evangelho é a promessa de respostas e certeza para aqueles que buscam diligentemente. Pode-se dizer que a história de nossa Igreja nos últimos dias começa com Tiago 1:5: “E se algum de vós tem falta de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente, sem repreensão, e ser-lhe-á dada”. Eu mesmo já passei por momentos em minha vida em que senti a orientação e as respostas fluírem do céu. Ao termos fome e sede de respostas, podemos ver todo o propósito do evangelho como o de fornecer respostas, e podemos ignorar o mistério de Deus e a importância das perguntas.
Quando eu era jovem, acreditava no Deus das Coisas Perdidas. Tenho várias lembranças de ter orado freneticamente ao Pai Celestial para que encontrássemos aquele último livro da biblioteca, aquele que era para entregar hoje, porque não podíamos ir à biblioteca até que tivéssemos encontrado todos os livros, e eu tinha certeza de que tinha literalmente procurado em todos os lugares. Em retrospectiva, é fácil olhar para os baixos riscos da situação e ver a tolice em meus apelos frenéticos. É fácil explicar o fato de que o livro sempre foi encontrado eventualmente. Ainda assim, tive algumas poucas experiências específicas em que senti que uma oração inconsequente foi respondida de uma maneira difícil de explicar. Há pouco tempo, vi meu filho passar por isso pela primeira vez quando, após sua simples oração, localizamos imediatamente as chaves que estávamos procurando há dias. Não sei se são respostas às orações, mas, nos momentos em que aconteceram, senti como se Deus estivesse me estendendo a mão com amor.
Uma dificuldade que a maioria de nós enfrenta ao passar da fé da infância para a fé adulta é a questão de por que Deus responderia a uma oração por chaves perdidas, mas não responderia orações que são muito mais consequentes: orações sobre decisões importantes da vida, orações por respostas a perguntas desconcertantes, orações por cura e recuperação de doenças terríveis, ou orações pela paz em um mundo assolado por tragédias.
Apesar disso, eu pessoalmente ainda acredito em um Deus de Coisas Perdidas. Creio que Deus às vezes responde a essas orações não apesar de suas inconsequências, mas por causa delas. Creio que uma resposta a uma oração sobre chaves perdidas pode ser uma mensagem de amor de nossos Pais Celestiais, que sabem que, quando se trata de assuntos de maior importância, teremos dificuldade em ver Suas mãos em nossa vida. Esta vida não é o tempo para recebermos todas as respostas, nem é o tempo para que tudo seja resolvido. Às vezes, Deus nos revela Sua vontade, mas muitas vezes somos obrigados a seguir em frente na incerteza.
Este momento de sua vida é um momento de tomada de decisões. Sei por experiência própria e pelo meu trabalho como orientadora acadêmica que, às vezes, pode parecer cansativo. Quando eu tinha vinte e poucos anos, lembro-me de olhar para trás na década anterior e perceber que eu tinha tomado uma decisão importante e transformadora a cada ano daquela década. Foi muito exaustivo. O ritmo das grandes tomadas de decisão diminuiu para mim, mas não parou. Acontece que tomar decisões potencialmente transformadoras é apenas uma parte da vida adulta.
O papel que Deus desempenha ao tomar essas decisões, no entanto, nem sempre é constante. Às vezes, vocês saberão por conta própria o que querem fazer, e Deus está lá para desempenhar um papel de apoio. Foi assim que me senti em relação à minha decisão de ir para a BYU como estudante de graduação. Não tive nenhuma grande revelação; era apenas onde eu queria estudar. Em outras ocasiões, vocês podem sentir que Deus os leva a uma direção muito específica, talvez até mesmo a uma direção que vocês não teriam escolhido por si mesmos. Quando estava decidindo para onde iria para o doutorado, eu sabia para onde queria ir, mas tive várias experiências espirituais poderosas que me levaram a outra direção. Até hoje tenho grande certeza de que, apesar dos desafios, era exatamente onde eu precisava estar naqueles cinco anos.
Mas em outros momentos vocês não terão certeza. Vocês não terão certeza sobre o que Deus quer que vocês façam e vocês não terão certeza sobre o que desejam fazer. Quando terminei o doutorado, senti-me perdida nestas duas áreas. Pensei que 11 anos de ensino superior deveriam ter me deixado com uma noção clara do que eu queria ser quando crescesse, mas em vez disso, essas águas pareciam mais turvas do que nunca. Pensei que, àquela altura de minha vida, deveria ter me sentido mais confiante de que poderia ouvir e conhecer a vontade do Senhor, mas naquela época parecia que os céus estavam em silêncio.
Naquele momento, a única coisa que eu podia fazer era seguir em frente. Eu queria seguir em frente no caminho certo, mas a única coisa que eu podia fazer naquele período era seguir em frente por um caminho. Eu queria saber que tudo ia dar certo, mas isso não era algo que eu pudesse saber. Aceitar a incerteza é difícil, mas em alguns momentos de nossa vida é a única coisa que podemos fazer.
Deus pode transformar nossas pedras em luz
Há muito tempo adoro a história do irmão de Jarede. Ele recebeu muita orientação do Senhor enquanto ele e sua família e amigos eram guiados em direção à terra prometida. Mas a parte da história que mais amo é quando o Senhor o fez responder à sua própria pergunta. O irmão de Jarede tinha seguido as instruções do Senhor de construir barcos, mas havia um problema. Os vasos estavam fechados e sem janelas; como resultado, não havia luz dentro das embarcações. Quando o irmão de Jarede se aproximou do Senhor, pareceu que ele esperava uma resposta:
Ó Senhor, eis que fiz conforme me ordenaste; e preparei os navios para meu povo e eis que neles não há luz. Ó, Senhor, consentirás que cruzemos estas grandes águas na escuridão?6
Mas, em vez de dar uma solução ao irmão de Jarede, o Senhor lhe disse o que ele provavelmente já sabia: Não pode ter janelas e não pode levar fogo.7 E então o Senhor voltou o problema para o irmão de Jarede e essencialmente perguntou: “O que você acha?”8
Na maioria das vezes, quando realmente não sei o que fazer, prefiro que Deus me diga o que fazer, porque tenho certeza de que posso fazer uma bagunça e que Deus pode me impedir de fazer bagunça. Quando deixados à nossa própria sorte — como tantas vezes acontece — e quando deixados para seguir em frente diante da incerteza — como tantas vezes estamos —, no final, todos tomaremos uma decisão da qual nos arrependemos, magoaremos alguém que pretendíamos ajudar, seguiremos um caminho sem saída ou nos encontraremos no lugar errado na hora errada.
O irmão de Jarede pensou na pergunta do Senhor e decidiu produzir dezesseis pedras de rocha fundida para que o Senhor as tocasse a fim de que brilhassem:
Ó Senhor, não te ires contra teu servo por causa de sua fraqueza . . . não obstante, ó Senhor, deste-nos o mandamento de invocar-te, para que de ti recebamos de acordo com nossos desejos.9
E o Senhor concedeu o desejo do irmão de Jarede e estendeu a mão para tocar as pedras e fazê-las brilhar.10
Ao aceitarmos as incertezas da vida e seguirmos em frente, mesmo sabendo que nem tudo sairá como gostaríamos ou esperaríamos, criamos nossas próprias pedras para o Senhor tocar e transformar em luz. Talvez algo de bom aconteça quando seguirmos em frente na escuridão. Talvez algo ruim aconteça. Provavelmente será um pouco dos dois. Mas Deus pode tocar todas essas pedras. Se tomarmos nossa decisão e oferecermos nossa decisão ao Senhor, Ele pode transformar todas as nossas pedras em luz. Ele pode nos dar oportunidades de fazer o bem, edificar relacionamentos, encontrar fé, mudar e crescer, mesmo com as pedras mais duras que oferecemos a Ele.
Como professora, passei muito tempo cuidadosamente planejando as aulas. Articulo metas de aprendizado e, em seguida, crio tarefas, atividades e perguntas de debate destinadas a atingir essas metas. Tento antecipar o pensamento dos alunos e descobrir como reagir ao pensamento deles. Mas minhas melhores lições geralmente são aquelas que convidam a um elemento de incerteza, lições nas quais não sei exatamente o que os alunos dirão ou como abordarão um problema em particular – e eles também não sabem. E as lições verdadeiramente transcendentes — aquelas após as quais volto para casa e não consigo parar de contar ao meu marido sobre a coisa incrível que aconteceu na aula — são sempre aquelas em que algo aconteceu que eu não podia prever ou planejar. É no limiar da incerteza que a verdadeira magia acontece. Como Mestre dos mestres, Deus certamente permitiria essa incerteza em Seus planos de lição para nossa vida. E é quando deixamos de lado nossa necessidade de conhecimento e certeza que Deus pode entrar em nossa vida em Sua amplitude e realizar verdadeiros milagres.
Deus é maior do que podemos saber, mas Deus nos conhece
Há algumas semanas, meu marido e eu fizemos uma viagem para Boston. Há muitas igrejas bonitas e antigas em Boston, e na manhã de domingo decidimos aproveitar a oportunidade e assistir a um culto na Old South Church, no centro da cidade.
O culto, os rituais e a música eram desconhecidos para mim. Sair do familiar me ajudou a prestar um tipo de atenção diferente do que costumo fazer em minhas experiências familiares e confortáveis na igreja aos domingos. Um hino particularmente me impressionou com seu sentimento semelhante a um salmo. Começou com uma expressão de incerteza: “Ó Deus, Deus meu, ó Deus gracioso, por que parece tão longe de mim?”11 E enquanto cantávamos as quatro estrofes, eu me vi esperando um ponto de virada que nunca veio, esperando que o hino terminasse com algo como “Deus, você pode se sentir longe de mim, mas eu sei que você está lá”. Em vez disso, cada versículo continuou seu questionamento. Por que há dor e sofrimento no mundo? Será que Deus está mesmo lá e será que Deus se importa? Não havia resolução, apenas perguntas, e por dias não consegui parar de pensar no hino.
Apesar de todas as escrituras e discursos que existem sobre certeza e conhecimento, podemos perder o mistério e a maravilha que vêm nos limites de nossa certeza, os momentos em que não sabemos. Néfi confessou: “Sei que [Deus] ama seus filhos; não conheço, no entanto, o significado de todas as coisas”.12 Em Alma, somos lembrados de que “fé não é ter um perfeito conhecimento das coisas”13 e que “há muitos mistérios que permanecem ocultos, que ninguém os conhece, a não ser o próprio Deus”.14 Jacó expressou essa admiração pelo mistério de Deus:
Eis que grandes e maravilhosas são as obras do Senhor. Quão insondáveis são as profundezas de seus mistérios! E é impossível ao homem descobrir todos os seus caminhos.15
Para mim, é um belo mistério que eu possa deixar de plenamente compreender Deus, mas que, no entanto, em minha própria incompreensão, posso sentir que tenho alguma compreensão do amor infinito de Deus por mim. Nem sempre me sinto confortável com a incerteza, mas agora reconheço que a certeza pode ser uma restrição. Quando somos capazes de abrir espaço para a incerteza em nossas vidas e para a possibilidade de coisas que estão além de nossa compreensão, podemos nos aproximar de nosso Deus, que nos conhece intimamente, mesmo que nosso estado humano nos impeça de conhecer plenamente a Deus. Como Paulo disse de forma tão bela: “Porque agora vemos por espelho, em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido”.16
Nesta vida sabemos apenas em parte e, de fato, quanto mais aprendo, mais vejo que não sei. Mas também acredito que Deus nos conhece completamente e que, em nossa incerteza, podemos aceitar o amor de Deus por nós como certo e constante. Talvez não saibamos como Deus transformará nossas pedras em luz, mas podemos ter esperança de que Deus vai transformar nossas pedras em luz.
Digo essas coisas em nome de Jesus Cristo, amém.
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- Ver 1 Coríntios 12:8-10.
- Ver Jad Abumrad, Robert Krulwich e Tim Howard, “Why Isn’t the Sky Blue?” [Por que o céu não é azul?], Radiolab, 21 de maio de 2012, produzido por Tim Howard e WNYC Studios, 14:23–17:10, wnycstudios.org/story/211213-sky-isn’t-blue.
- Euclides, Os Elementos (c. 300 a.C.); citado em Victor J. Katz, A History of Mathematics: An Introduction, 3ª ed.(Boston: Addison-Wesley, 2009), 53. Traduzido em português por Irineu Bicudo, (2009), 98.
- Giovanni Girolamo Saccheri, Euclid Freed of Every Flaw [Euclides Livre de Todas as Falhas] (1733); citado em Katz, History of Mathematics,p. 693.
- Alma 32:21.
- Éter 2:22.
- Ver Éter 2:23.
- Ver Éter 2:25.
- Éter 3:2.
- Ver Éter 3:6; ver também Éter6:2-3.
- John Bell, “O God, My God”, Iona Community hymn, 1988, em Arthur G. Clyde, ed., The New Century Hymnal (Cleveland: Pilgrim Press, 1995), n. 515.
- 1 Néfi 11:17.
- Alma 32:21.
- Alma 40:3.
- Jacó 4:8.
- 1 Coríntios 13:12.

Amy Tanner, coordenadora de graduação do Departamento de Educação Matemática da BYU, deu este discurso devocional em 9 de julho de 2019.