Devocional

Mais amor, menos desprezo

Presidente do Instituto Americano de Empresas

25 de abril de 2019

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Se quisermos vencer o problema do desprezo, precisaremos de algo mais radical do que a civilidade – algo que fale ao verdadeiro desejo de nosso coração. Precisamos de amor.


Presidente Worthen, ilustres convidados, pais, amigos e membros da turma de 2019 da Universidade Brigham Young: Parabéns por este dia importante e obrigado por esta incrível honra. Com este diploma honorário, tenho orgulho de dizer que finalmente sou um verdadeiro membro da comunidade da BYU.

Confesso que, até este momento, só fingi ser membro da comunidade da BYU. Sei que isso soa mal, então deixem-me explicar. Há vários anos, vim a este belo lugar, a BYU, para dar uma palestra. Meus maravilhosos anfitriões me mandaram para casa com uma tonelada de brindes da BYU: camisetas, canecas – tudo o que vocês possam imaginar. Vocês são ótimos em marketing de produtos.

Um presente especialmente bacana que recebi naquele dia foi uma maleta. Ela tinha o logotipo da BYU estampado na frente. Na verdade, eu precisava de uma maleta nova, mas hesitei em usá-la por causa do logotipo. Parecia um pouco estranho, como se fosse propaganda enganosa. Vejam bem, não sou membro do corpo docente da BYU, e nem sou membro de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Sou católico.

Alguém me disse, a propósito, que sou seu católico favorito – mas imagino que vocês digam isso a todos os católicos.

Quando expressei essa hesitação, minha esposa, Esther, disse: “Que besteira. Use a maleta. Ela é bonita”.

Então, coloquei minhas coisas dentro da maleta e a levei para minhas viagens. Eu viajo o tempo todo. Estou sempre em aeroportos. E a situação é a seguinte: Percebi que as pessoas olhavam para minha maleta e depois olhavam para mim. Elas ficavam com uma expressão estranha no rosto, do tipo: “Nunca vi um mórmon hipster e idoso antes”. (Desculpem-me, “santo dos últimos dias”!) Isso era interessante, mas aqui está a parte engraçada: Descobri que isso estava mudando meu comportamento. Eu estava agindo com mais amor e bondade do que normalmente agiria. As pessoas olhavam para minha maleta, e de repente eu estava querendo ajudá-las com sua bagagem. Eu queria oferecer meu lugar na fila. Esse tipo de coisa. Por quê? Porque eu estava inconscientemente tentando viver de acordo com os altos padrões de bondade da sua igreja e da sua universidade. No mínimo, eu estava tentando não prejudicar sua merecida reputação.

E sabem de uma coisa? Eu até parei de carregar copos de café. Olha, eu adoro café, mas não queria que as pessoas pensassem que um membro de sua igreja é um hipócrita! Eu tinha essa fantasia paranoica de algum cara dizendo à esposa: “Vi um mórmon no aeroporto de O’Hare pedindo um café venti latte na Starbucks. Eu sabia que eles eram hipócritas”. Eu não queria isso.

Sabem do que mais? Aquela maleta me tornou uma pessoa mais feliz, uma pessoa mais amorosa. Eu era a pessoa que eu queria ser. Por quê? Porque eu estava tentando ser como vocês. Então, qual é a lição aqui? Não é que as maletas da BYU tenham propriedades mágicas. É que seu maior testemunho para o mundo como membros desta comunidade é a conduta de sua vida. Nossa nação e o mundo precisam disso. Eles precisam de vocês, hoje mais do que nunca.

Se prestarem atenção na política, na televisão ou nas mídias sociais, o que veem hoje? Vocês veem recriminação, reprovação, insultos e sarcasmo. Vocês veem líderes nos níveis mais altos de nosso país que intimidam e repreendem aqueles de quem discordam. Vocês veem famílias divididas por causa de discordâncias políticas. Vocês veem adversários políticos que tratam uns aos outros como inimigos.

As pessoas costumam caracterizar o momento atual dos Estados Unidos como sendo de “raiva”. Se ao menos isso fosse verdade. A raiva é uma emoção que ocorre quando queremos mudar o comportamento de alguém e acreditamos que podemos fazer isso. Segundo as pesquisas sobre raiva, embora a raiva seja frequentemente percebida como uma emoção negativa, ela tem um propósito social. E não é o de afastar os outros. Em vez disso, ela tem o objetivo de remover elementos problemáticos de um relacionamento e reaproximar as pessoas. Acreditem ou não, não há evidências de que, em um casamento, a raiva esteja relacionada à separação ou ao divórcio.

Sou casado com uma espanhola faz vinte e oito anos. O segredo do sucesso de minhas décadas de casamento é a falta de correlação entre raiva e divórcio.

O problema não é a raiva – é o desprezo. Nas palavras de um filósofo do século XIX, Arthur Schopenhauer, o desprezo “é a convicção incontestável da falta de valor do outro”.1 O poder destrutivo do desprezo está bem documentado no trabalho do famoso psicólogo social e especialista em relacionamentos, John M. Gottman, professor emérito da Universidade de Washington em Seattle. Ao longo de seu trabalho, Gottman estudou milhares de casais. Ele explicou que os maiores sinais de alerta para o divórcio são indicadores de desprezo. Entre eles, estão o sarcasmo, a zombaria, o humor hostil e, o pior de todos, revirar os olhos.2

Tenho filhos adolescentes. Vejo muitas reviradas de olhos. Mas se vocês reviram os olhos para alguém que amam, ai de vocês. Esse é um pequeno ato que efetivamente diz: “Você não tem valor” para a única pessoa – seu cônjuge – que vocês deveriam amar mais do que qualquer outra. Querem ver se um casal vai acabar se divorciando? Observem como eles discutem assuntos controversos e vejam se algum dos parceiros revira os olhos.

E assim como o desprezo arruína um casamento, ele pode destruir um país. Os Estados Unidos estão desenvolvendo uma “cultura de desprezo” – um hábito de ver as pessoas que discordam de nós não como meramente incorretas ou mal orientadas, mas como sendo sem valor.

Isso está causando danos imensos ao nosso país. Um em cada seis estadunidenses parou de conversar sobre política com amigos próximos e familiares desde as eleições de 2016. Milhões estão organizando suas vidas sociais e selecionando suas notícias e informações para evitar ouvir pontos de vista diferentes dos seus. A polarização ideológica está em níveis mais altos do que em qualquer outro momento desde a Guerra Civil em nosso país.

Ouçam as palavras do Presidente da Igreja, Russell M. Nelson: “O ódio entre irmãos e vizinhos transformou hoje as cidades sagradas em locais de sofrimento.”3 Ele disse isso em 2002. Hoje, essa afirmação é ainda mais verdadeira, não é?

E isso está prejudicando mais do que a nossa nação. Lembrem-se de que os Estados Unidos são um farol de esperança para o resto do mundo. Somos um exemplo de capitalismo democrático que tirou dois bilhões de nossos irmãos e irmãs da pobreza extrema só no último meio século. Esta é uma nação que atraiu vocês ou seus antepassados com a promessa de oportunidades iguais, liberdade religiosa e uma vida melhor para vocês e suas famílias. Quando os Estados Unidos se veem divididos, tornamo-nos incapazes de viver de acordo com o plano – um plano sagrado – para nossa nação, que é o de brilhar como uma luz para o resto do mundo.

Então, do que precisamos? Alguns dizem que precisamos concordar mais, mas isso está errado. Discordar é bom, porque a concorrência é boa. Ela nos torna perspicazes e fortes, seja nos esportes, na política, na economia ou no mundo das ideias. Não precisamos discordar menos; precisamos discordar melhor. Outras pessoas dizem que precisamos de mais civilidade. Mas isso também está errado, porque a civilidade é um padrão extremamente baixo para nós. Imaginem que eu lhes dissesse que minha esposa, Esther, e eu somos “civilizados um com o outro”. Vocês diriam que precisamos de terapia!

Se quisermos vencer o problema do desprezo, precisaremos de algo mais radical do que a civilidade – algo que fale ao verdadeiro desejo de nosso coração. Precisamos de amor, que foi definido por São Tomás de Aquino como “querer o bem do outro”.4 Precisamos de uma nova geração capaz de exemplificar vidas de amor em meio a uma cultura de desprezo. Precisamos de jovens que possam viver na cultura atual as palavras de Helamã:

E aconteceu que saíram, pregando e anunciando…

E todos os que se convenceram abandonaram suas armas de guerra, bem como seu ódio e as tradições de seus pais. [Helamã 5:50-51] 

Ele estava falando de vocês. Não se enganem, isso não é algo fácil de se fazer. Requer pessoas que não fujam do problema, que não tenham medo de se infiltrar na cultura do desprezo e que sejam capazes de criar um conjunto melhor de valores. Isso requer a habilidade de estar na cultura, mas não ser dela. Se pensarmos nisso, é um pouco como o trabalho missionário, não é? Os missionários têm o treinamento e a experiência para estar na sociedade sem serem sugados por suas patologias. Eles têm a coragem e a fortaleza necessárias para enfrentar a resistência e seguir em frente com a alegria de compartilhar a verdade.

Só por curiosidade, por acaso vocês conhecem alguém com experiência missionária? Bem, adivinhem só? É hora de tirar o pó dessa experiência e usá-la de uma maneira totalmente nova, começando hoje.

Perto de minha casa, há um retiro católico onde minha esposa e eu damos aulas para noivos em preparação para o casamento. Na capela, há uma placa afixada sobre a porta – não a porta de entrada, mas a porta de saída para o estacionamento. Ela está lá para que as pessoas a vejam quando estiverem saindo. A placa diz: “Vocês estão agora entrando no território da missão”. A mensagem é simples, mas realmente profunda: Vocês estão aqui porque descobriram o que é bom e verdadeiro, mas vão sair para onde as pessoas ainda não encontraram o que vocês descobriram. Vocês têm o privilégio de compartilhá-lo – com alegria e confiança.

Essa deve ser uma mensagem para vocês que querem tornar esta nação e o mundo melhores. Vocês sabem do que o nosso mundo precisa: mais amor, menos desprezo. Vocês têm as habilidades e o treinamento para tornar isso realidade. A maioria de vocês foi criada a vida inteira com os valores que eu magicamente obtive por alguns minutos com a minha maleta da BYU. Vocês receberam uma educação por meio de trabalho árduo em uma das melhores universidades do mundo. Vocês se prepararam a vida inteira para entrar no mundo e torná-lo melhor. Esta universidade tem um lema não oficial: “Entre para aprender; saia para servir”. Começando hoje, vocês podem viver à altura desse lema – elevando e unindo nossa grande nação ao santificar seu aprendizado e trabalho diário.

Portanto, senhoras e senhores da turma de 2019 da BYU, oro para que nosso Pai Celestial abençoe abundantemente o mundo por meio de vocês. Parabéns por esta conquista. E não se esqueçam: Vocês estão agora entrando, novamente, no território da missão.

Que Deus os abençoe. Que Deus abençoe este país. Muito obrigado.

© Brigham Young University. Todos os direitos reservados.

Notas

1. Arthur Schopenhauer, “On Psychology”, Essays and Aphorisms [“Sobre a Psicologia”, Ensaios e Aforismos], trans. R. J. Hollingdale (Londres: Penguin Books, 2004), 170.

2. Ver John M. Gottman e Nan Silver, The Seven Principles for Making Marriage Work: A Practical Guide from the Country’s Forememost Relationship Expert [Os Sete Princípios para Fazer o Casamento Funcionar: Um Guia Prático do Maior Especialista em Relacionamento do País] (Nova York: Harmony Books, 2015), 34.

3. Russell M. Nelson, “Bem-Aventurados os Pacificadores”, A Liahona, novembro de 2002.

4. Ver São Tomás de Aquino, resposta à pergunta 59, artigo 4, “Se quem comete uma injustiça peca mortalmente?” na Segunda Parte da Segunda Parte, Summa Theologica (1273): “caridade, que nos leva a desejar o bem do outro”. Ver também Arthur C. Brooks, Love Your Enemies: How Decent People Can Save America from the Culture of Contempt [Ame Seus Inimigos: Como as Pessoas Decentes Podem Salvar os Estados Unidos da Cultura do Desprezo] (Nova York: Broadside Books, 2019), p. 13; ver também 219, nota de rodapé 10.

Arthur C. Brooks

Arthur C. Brooks – autor best-seller, cientista social e presidente do Instituto Americano de Empresas – recebeu um doutorado honorário quando este discurso de formatura da BYU foi proferido em 25 de abril de 2019.