Cada um de nós, de um modo ou de outro, grandioso ou insignificante, extraordinário ou discreto, vai passar algum tempo na cadeia de Liberty — espiritualmente falando.
Meus queridos jovens amigos, é uma grande alegria para a Irmã Holland e eu estarmos com vocês nesta noite para esta transmissão mundial via satélite. É sempre uma emoção estar aqui no Marriott Center. Gostaríamos de poder estar onde vocês estão, vê-los pessoalmente e apertar suas mãos. Ainda não descobrimos uma maneira de fazer isso, mas enviamos nosso amor e nossas saudações a todos vocês, onde quer que estejam no mundo. Apesar da vastidão do nosso público global, esperamos que todos vocês sejam individualmente capazes de sentir o amor que temos por vocês esta noite e que cada um de vocês possa aproveitar algo da nossa mensagem que seja aplicável em suas vidas.
O Profeta na cadeia de Liberty
Uma das grandes bênçãos de nossas designações como Autoridades Gerais é a chance de visitar membros da Igreja em vários locais ao redor do mundo e aprender mais sobre a história de nossos membros em todo o mundo. Nesse espírito, desejo compartilhar com vocês esta noite alguns sentimentos que me vieram durante uma designação que recebi na primavera passada quando fui designado a visitar a Estaca Platte City, no oeste do Missouri, aqui nos Estados Unidos.
A Estaca Platte City, no Missouri, fica ao lado da Estaca Liberty Missouri, agora um local muito famoso na história da Igreja, abrangendo muitos lugares importantes, incluindo a ironicamente chamada cadeia de Liberty [liberdade em português]. Com base em seu estudo da história da Igreja, todos vocês sabem algo da experiência que o Profeta Joseph Smith e os irmãos da Igreja tiveram enquanto estavam presos naquela instalação durante o inverno de 1838-1839. Este foi um momento terrivelmente difícil em nossa história para a Igreja em geral e certamente para o próprio Profeta Joseph, que suportou o fardo da perseguição naquele período. De fato, arrisco dizer que, até seu martírio cinco anos e meio depois, não houve época mais penosa na vida de Joseph do que essa prisão cruel, ilegal e injustificada na cadeia de Liberty.
O tempo não permite uma discussão detalhada das experiências que levaram até este momento da história da Igreja, mas basta dizer que problemas de vários tipos foram acumulando desde que o Profeta Joseph recebeu uma revelação em julho de 1831 designando Missouri como o lugar “[consagrado] para a reunião dos santos” e a construção da “cidade de Sião” (D&C 57:1,2). Em outubro de 1838, uma guerra declarada parecia inevitável entre as forças mórmons e não-mórmons que se confrontavam sobre essas questões. Após serem expulsos de vários dos condados na parte ocidental daquele estado, e sob a presunção de que eles tinham sido convidados a discutir maneiras de desarmar a situação volátil que havia se desenvolvido, cinco líderes da Igreja, incluindo o Profeta Joseph, marchando sob uma bandeira de trégua, se aproximaram do acampamento da milícia do Missouri perto do pequeno assentamento de Far West, localizado no condado de Caldwell.
Como se viu, a ideia de trégua não foi respeitada, e os líderes da Igreja foram imediatamente acorrentados e colocados sob forte vigilância. Na manhã seguinte a esta prisão, mais dois líderes Santos dos Últimos Dias, incluindo o irmão do Profeta, Hyrum, foram presos, totalizando sete em cativeiro.
A injustiça evoluiu rapidamente para uma tragédia iminente quando um “tribunal” militar convocado por oficiais daquela milícia ordenou que Joseph Smith e os outros seis prisioneiros fossem levados para uma praça pública em Far West e sumariamente fuzilados. Para seu eterno reconhecimento, o Brigadeiro-General Alexander Doniphan, oficial das forças do Missouri, recusou-se com ousadia e coragem a obedecer uma ordem tão desumana e injustificável. Em um ato desafiador que poderia tê-lo levado à sua própria corte marcial, ele gritou contra o oficial comandante:
Isso é assassinato a sangue frio. Não cumprirei sua ordem. E se executar esses homens, vou acusá-lo perante um tribunal terreno, juro por Deus!1
Ao mostrar tal coragem e integridade, Doniphan não somente salvou a vida desses sete homens, mas se tornou eternamente estimado pelos Santos dos Últimos Dias em todas as gerações.
Com a execução evitada, os sete líderes da Igreja foram levados a pé de Far West até Independence e, depois, de Independence para Richmond. Parley P. Pratt foi enviado para o condado de Daviess, nas proximidades, para ser julgado lá, e os outros seis prisioneiros, incluindo Joseph e Hyrum, foram enviados para Liberty, a sede do condado vizinho de Clay, para aguardar julgamento lá na próxima primavera. Eles chegaram à Liberty em 1 de dezembro de 1838, bem quando o inverno estava chegando.
A cadeia, uma das poucas estruturas do tipo naquela região, e com certeza uma das mais sinistras, era considerada à prova de fuga e, provavelmente, era mesmo. Tinha dois andares. O andar superior dava acesso ao mundo exterior por uma única porta, pequena e pesada. No centro daquele andar havia um alçapão pelo qual os prisioneiros eram então levados até o piso inferior ou calabouço. As paredes externas da prisão eram de pedra calcária toscamente cortada, com paredes internas de troncos de carvalho com 30 centímetros de espessura. Essas duas paredes eram separadas por um espaço de 30 centímetros preenchido com pedras soltas. Combinadas, essas paredes fizeram uma barreira formidável, virtualmente impenetrável de 1,2 metros de espessura.
No calabouço, a altura do chão ao teto era de apenas 1,80 metros, e, como alguns dos homens, inclusive o Profeta Joseph, tinham mais de 1,80 metros de altura, isso significava que, quando estavam de pé, ficavam constantemente curvados e, quando estavam deitados, ficavam principalmente sobre as pedras ásperas e nuas do chão da prisão, cobertas aqui e ali por um pouco de palha solta e suja ou, às vezes, por um sujo tapete de palha.
A comida fornecida aos prisioneiros era de péssima qualidade e, por vezes, contaminada — tão imunda que um deles declarou: “não conseguiríamos comê-la a menos que fôssemos forçados pela fome mais extrema.”2 Em nada menos que quatro ocasiões, deram-lhes comida envenenada, fazendo com que ficassem tão violentamente doentes que passavam dias entre vômito e uma espécie de delírio, sem sequer se importarem se viveriam ou morreriam. Nas cartas escritas pelo profeta Joseph Smith, ele descreveu a cadeia como um
inferno rodeado por demônios onde somos obrigados a ouvir juras blasfemas e assistir a cenas de bebedice, hipocrisia e deboches de todo tipo.3
“Nós não temos cobertores suficientes para nos manter aquecidos”, disse ele, “e quando temos um fogo, somos obrigados a ter uma fumaça quase constante.”4 “Nossas almas estão abatidas”5 e “meus nervos tremem por causa do longo confinamento.6 “Pena, ou língua, ou anjos”, escreveu Joseph, não poderia descrever adequadamente “a malícia do inferno” que ele sofreu lá.7 E tudo isso ocorreu durante aquele que, segundo alguns relatos, foi o inverno mais frio já registrado no estado do Missouri.
Não é meu propósito fazer deste um discurso sobre a tristeza e dificuldade que esses homens enfrentaram na cadeia de Liberty, então deixem-me colocar algumas fotos na tela e concluir esta pequena parte introdutória da minha mensagem. Prometo que tenho outra coisa em mente para dizer.
[Uma foto da cadeia de Liberty foi mostrada.] Aqui está uma foto da prisão praticamente como estava na época em que Joseph e seus irmãos foram encarcerados lá.
[Uma outra foto do da cadeia de Liberty foi mostrada.] Aqui está uma foto tirada alguns anos depois, quando oficiais e historiadores da Igreja visitaram o local. Eu não tenho certeza se esse homem no topo está tentando sair ou entrar.
[Uma foto de um modelo de reconstrução do interior da cadeia de Liberty foi mostrada.] Aqui está uma seção transversal da reconstrução da prisão feita pela Igreja, que agora pode ser vista em no centro de visitantes local. Observem a estrutura de dois andares com uma corda e um balde, a única ligação entre o calabouço e o andar superior.
[Uma foto da pintura Joseph in Liberty Jail de Liz Lemon Swindle foi mostrada.] Aqui está uma pintura de Liz Lemon Swindle mostrando Joseph em oração. Observem o olhar de desamparo e anseio no rosto de Joseph.
[Uma foto da pintura Joseph Smith em Liberty Jail de Greg Olsen foi mostrada.] E aqui está uma pintura de Greg Olsen mostrando como Joseph deve ter escrito algumas das revelações que vieram durante esta prisão.
[Uma foto do Templo de Toronto Ontário Canadá foi mostrada.] E esta é minha última foto, que me leva à verdadeira mensagem que vim dar esta noite.
Uma experiência de prisão-templo
A maioria de nós, a maior parte do tempo, fala sobre o edifício em Liberty imaginando uma ‘cadeia’ ou ‘prisão’ — e com certeza era isso. Mas o Élder Brigham H. Roberts, ao registrar a história da Igreja, falou da instalação como um templo, ou, mais precisamente, uma “prisão-templo”.8 O Élder Neal A. Maxwell usou a mesma frase em alguns de seus escritos.9 Certamente faltava a pureza, a beleza, o conforto e a limpeza de nossos templos verdadeiros, nossos templos dedicados. O palavreado e o comportamento dos guardas e criminosos que ali entravam não se assemelhavam em nada ao que vemos nos templos. De fato, a brutalidade e a injustiça restritiva dessa experiência em Liberty a faria parecer a própria antítese do espírito libertador e misericordioso de nossos templos e das ordenanças que neles são realizadas. Então, em que sentido poderia a cadeia de Liberty ser chamada de “templo” – ou pelo menos uma espécie de templo – no desenvolvimento de Joseph Smith pessoalmente e em seu papel como profeta? E o que esse título nos diz sobre o amor e os ensinamentos de Deus, inclusive sobre onde e quando esse amor e ensinamentos são manifestados?
Ao pensarmos nessas coisas, será que as experiências espirituais, as experiências reveladoras, as experiências sagradas podem vir a cada um de nós em todas as muitas e variadas etapas e circunstâncias de nossas vidas, se quisermos, se perseverarmos e orarmos, e se mantivermos nossa fé forte através de nossas dificuldades? Nós amamos e apreciamos nossos templos dedicados e as ordenanças essenciais de exaltação que são realizadas lá. Agradecemos aos céus e aos líderes da Igreja por mais e mais deles estarem sendo construídos, tornando-os mais acessíveis a cada um de nós. São verdadeiramente as estruturas mais santas e mais sagradas do reino de Deus, às quais todos devemos ir tão dignamente e tão frequentemente quanto possível.
Mas a mensagem desta noite é que, quando vocês precisam, vocês podem ter uma experiência sagrada, reveladora e profundamente instrutiva com o Senhor em qualquer situação em que vocês se encontrarem. Vocês podem ter experiências sagradas, reveladoras e profundamente instrutivas com o Senhor nos momentos mais angustiantes da vida — nos piores lugares, ao sofrer as injustiças mais dolorosas, ao enfrentar as probabilidades e a oposição mais insuperáveis que jamais enfrentarão.
Agora, falemos sobre esses conceitos por um momento. Cada um de nós, de um modo ou de outro, grandioso ou insignificante, extraordinário ou discreto, vai passar algum tempo na cadeia de Liberty — espiritualmente falando. Enfrentaremos coisas que não queremos enfrentar por motivos que talvez não tenham sido culpa nossa. De fato, talvez tenhamos que enfrentar situações difíceis por atitudes absolutamente corretas de nossa parte, exatamente porque estávamos tentando guardar os mandamentos do Senhor. Talvez tenhamos que enfrentar perseguição; talvez tenhamos que suportar a tristeza e a separação de entes queridos, ou fome, frio e desconsolo. Sim, antes de nossas vidas acabarem, podemos todos ter uma pequena sensação do que os profetas enfrentaram muitas vezes em suas vidas. Mas, as lições do inverno de 1838–1839 nos ensinam que qualquer experiência pode se transformar em uma experiência redentora se permanecermos conectados com o Pai Celestial durante essa dificuldade. Essas difíceis lições nos ensinam que os momentos excruciantes para o homem são oportunidades para Deus, e que se formos humildes e fiéis, se crermos e não amaldiçoarmos a Deus por nossos problemas, Ele pode transformar as prisões injustas, desumanas e debilitantes de nossa vida em templos — ou pelo menos em algo que traga consolo e revelação, a companhia divina e a paz.
Deixem-me desenvolver esta ideia um pouco mais. Acabei de dizer que tempos difíceis podem acontecer conosco. O presidente Joseph Fielding Smith, sobrinho-neto do Profeta Joseph e neto de Hyrum, que também foi encarcerado lá, disse algo ainda mais forte do que isso quando ele dedicou o Centro de Visitantes da cadeia de Liberty em 1963. Fazendo alusão ao tipo de história que analisamos esta noite e observando a cena em que seu avô e seu tio-avô foram detidos injustamente, ele disse que talvez essas coisas tenham que acontecer – não apenas podem, mas tenham que acontecer. Ele disse:
Ao ler a história daqueles dias, os dias que precederam e os dias que se seguiram, cheguei à conclusão de que as dificuldades, a perseguição, a oposição quase universal para com a Igreja naquela época eram necessárias. De qualquer forma, elas se tornaram professoras para o nosso povo. Elas ajudaram a torná-los fortes.10
Lições da cadeia de Liberty
Bem, sem tentar determinar quais desses tipos de experiências em nossas vidas são “obrigatórias” e quais são “opcionais”, mas ainda boas para nós, gostaria de sugerir apenas algumas das lições aprendidas em Liberty – aquelas experiências que foram “professoras” para Joseph e também o podem ser para nós, experiências que contribuem tanto para nossa educação na mortalidade quanto nossa exaltação na eternidade.
Ao selecionar essas lições, eu noto mais um tipo de bênção que saiu dessa adversidade. Para fazer valer os pontos que agora vou tentar fazer em minha mensagem para vocês, eu usei diretamente as palavras reveladoras que vieram dos lábios de Joseph Smith durante este tempo de tristeza, palavras que agora canonizamos como escritura sagrada em Doutrina e Convênios. Acho que não devemos ter escrituras favoritas, e tenho um número suficiente delas para que vocês não consigam me forçar a escolher uma ou duas, mas certamente qualquer lista de minhas escrituras favoritas teria de incluir aquelas escritas na escuridão da cadeia de Liberty.
O que aprendemos de imediato é que Deus não estava apenas ensinando Joseph Smith naquele momento de aprisionamento, mas também a todos nós — inclusive às gerações futuras. Que dádiva das escrituras! E que preço alto foi pago por isso! Mas quão vazias seriam nossas vidas como Santos dos Últimos Dias se não tivéssemos as Seções 121, 122 e 123 de Doutrina e Convênios. Se vocês não as leram recentemente, eu quero que as leiam esta noite ou, no mais tardar, amanhã. Esse é o seu trabalho de casa, e eu vou acompanhá-los! São apenas cerca de oito páginas de texto, mas elas tocarão seu coração com sua beleza e poder espiritual. E elas os lembrarão que Deus muitas vezes age de forma misteriosa para realizar suas maravilhas.11 Em qualquer caso, Ele certamente transformou a adversidade em bênção ao nos dar aqueles escritos e reflexões sagrados, tão puros, nobres e cristãos em tom e conteúdo, porém produzidos em um ambiente tão impuro, ignóbil e não cristão.
1. Todo mundo enfrenta desafios
Agora, então, três lições da cadeia de Liberty: Posso sugerir que a primeira delas é inerente ao que eu já disse – que todos, incluindo (e talvez especialmente) os justos, serão chamados a enfrentar dificuldades. Quando isso acontece, às vezes podemos temer que Deus nos abandonou, e podemos ficar, pelo menos por um tempo, imaginando quando nossos problemas acabarão. Como indivíduos, como famílias, como comunidades e como nações, provavelmente todos tiveram ou terão a oportunidade de sentir o que Joseph Smith sentiu quando perguntou por que tal tristeza tinha que vir e por quanto tempo suas trevas e danos permaneceriam. Nós nos identificamos com ele quando ele clama da profundidade e do desânimo de seu confinamento:
Ó Deus, onde estás? […]
Até quando tua mão será retida […]?
Sim, ó Senhor, até quando [teu povo suportará] esses agravos […] antes que […] tuas entranhas deles se compadeçam? [D&C 121:1–3]
Essa é uma súplica dolorosa e pessoal, vinda do coração, uma solidão espiritual que possivelmente todos venhamos a sentir em algum momento de nossa vida.
Talvez vocês já tenham tido tais momentos em sua jovem existência. Se for o caso, espero que vocês não tenham tido muitos. Sempre que esses momentos extremos ocorrerem, não devemos sucumbir ao temor de que Deus nos tenha abandonado ou de que Ele não ouça nossas orações. Ele nos ouve, sim. Ele nos vê, sim. Ele nos ama, sim. Quando nos encontramos em circunstâncias terríveis e queremos clamar “Onde estás?”, é imperativo que nos lembremos que Ele está bem ali conosco – onde Ele sempre esteve! Devemos continuar a acreditar, continuar a ter fé, continuar a orar e a suplicar aos céus, mesmo que sintamos por algum tempo que nossas orações não são ouvidas e que Deus, de alguma forma, afastou-Se. Ele está conosco. Nossas orações são ouvidas. E quando choramos, Ele e os anjos do céu choram conosco.
Nos momentos de solidão, abandono e grandes dificuldades, temos que suportar, continuar, persistir. Essa foi a mensagem do Salvador na parábola da viúva impertinente (ver Lucas 18:1–8; ver também Lucas 11:5–10). Continuem a bater naquela porta. Continuem a suplicar. Enquanto isso, saibam que Deus ouve suas súplicas e conhece suas aflições. Deus é seu Pai Celestial e vocês são Seus filhos e Suas filhas.
Quando o que tem que ser tiver sido e quando as lições a serem aprendidas tiverem sido aprendidas, será para nós como foi para o Profeta Joseph. O momento em que ele se sentiu mais sozinho e distante dos ouvidos do céu foi exatamente o momento em que ele recebeu a maravilhosa ministração do Espírito e as maravilhosas e gloriosas respostas que vieram de seu Pai Celestial. Naquele calabouço sombrio e naquele momento deprimente, veio a voz de Deus, dizendo:
Meu filho, paz seja com tua alma; tua adversidade e tuas aflições não durarão mais que um momento;
E então, se as suportares bem, Deus te exaltará no alto; triunfarás sobre todos os teus inimigos. [D&C 121:7–8]
Mesmo que circunstâncias aparentemente injustas se acumulem sobre nós e mesmo que coisas indelicadas e imerecidas nos sejam feitas – talvez por aqueles que consideramos inimigos, mas também, em alguns casos, por aqueles que pensávamos ser amigos – ainda assim, através de tudo isso, Deus está conosco. É por isso que esta noite o nosso maravilhoso coral cantou o tradicional hino cristão de Sarah Adams “Mais Perto Quero Estar,” incluindo o quarto verso, raramente cantado, que eles entoaram tão belamente:
Então ao despertar
Junto de ti
As minhas aflições
Deixarei ali.12
Não estamos sozinhos em nossas pequenas prisões aqui. Quando sofremos, de fato talvez estejamos mais próximos de Deus do que jamais estivemos em toda a vida. Esse conhecimento pode transformar cada uma dessas situações em um possível templo.
Em relação à nossa jornada terrena, o Senhor prometeu:
Pois irei adiante de vós. Estarei à vossa direita e à vossa esquerda e meu Espírito estará em vosso coração e meus anjos ao vosso redor para vos suster. [D&C 84:88]
Essa é uma declaração eterna do amor e cuidado de Deus por nós, incluindo – e talvez especialmente – em tempos de angústia.
2. Mesmo os dignos sofrerão
Em segundo lugar, precisamos perceber que só porque as coisas difíceis acontecem – às vezes coisas injustas e aparentemente injustificadas – isso não significa que somos injustos ou que somos indignos de bênçãos ou que Deus está desapontado conosco. É claro que a pecaminosidade traz sofrimento, e a única resposta a esse comportamento é o arrependimento. Mas às vezes o sofrimento chega aos justos também. Vocês devem se recordar de que, das profundezas da cadeia de Liberty, quando Joseph foi lembrado de que ele tinha de fato sido “[lançado] em dificuldades”, havia passado por tribulação e sido acusado de falsidades, tinha sido arrancado de sua família e lançado no abismo, nas mãos de assassinos, ele ainda assim deveria se lembrar de que a mesma coisa havia acontecido com o Salvador do mundo, e porque Ele foi triunfante, nós também seremos triunfantes (ver D&C 122:4-7). Ao nos dar esta lembrança sóbria do que o Salvador passou, a revelação da cadeia de Liberty afirma: “O Filho do Homem desceu abaixo de todas elas. És tu maior do que ele?” (D&C 122:8)
Não, Joseph Smith não era maior que o Salvador e nós também não somos. E quando prometemos seguir o Salvador, seguir Seus passos e ser Seus discípulos, prometemos ir aonde esse caminho divino nos levar. E o caminho da salvação sempre passou, de um jeito ou de outro, pelo Getsêmani. Assim, se o Salvador enfrentou tamanha injustiça e desalento, tamanhas perseguições, iniquidade e sofrimento, não podemos esperar não ter que enfrentar um pouco dessas coisas se ainda quisermos ser chamados de Seus discípulos verdadeiros e seguidores fiéis. Isso certamente ressalta o fato de que os justos – no caso do Salvador, a personificação da justiça – podem ser totalmente dignos diante de Deus e ainda assim sofrerem.
De fato, deve ser um grande consolo doutrinário para nós saber que Jesus, durante a Expiação, passou por todo o sofrimento e tristeza, todas as decepções e injustiças que toda a família humana tinha sofrido ou iria sofrer, desde Adão e Eva até o fim do mundo, para que não tivéssemos que enfrentá-los de modo tão severo ou tão intenso. Por mais pesado que seja o nosso fardo, ele seria muito mais pesado se o Salvador não tivesse passado por isso antes de nós e suportado esse fardo conosco e por nós.
Logo no início do ministério do profeta Joseph, o Salvador ensinou a ele essa doutrina. Depois de falar de sofrimentos tão dolorosos e tão difíceis de suportar, Jesus disse:
Eu, Deus, sofri essas coisas por todos, para que não precisem sofrer caso se arrependam. [D&C 19:16]
Em nossos momentos de dor e provação, acho que tremeríamos em pensar que poderia ser pior, mas a resposta a isso claramente é que poderia ser pior e seria pior. Apenas por meio de nossa fé, arrependimento e obediência ao evangelho que proporcionou a sagrada Expiação é que não é pior.
Além disso, observamos que não só o Salvador sofreu, e no caso Dele sendo completamente inocente, mas também a maioria dos profetas e os outros grandes homens e mulheres citados nas escrituras também sofreram. Citem um profeta do Antigo Testamento ou Livro de Mórmon, citem um Apóstolo do Novo Testamento, citem praticamente qualquer um dos líderes em qualquer dispensação, incluindo a nossa, e vocês citarão alguém que teve problemas.
O que quero dizer com isso? Se vocês estão tendo um dia ruim, estão longe de ser os únicos — e estão em ótima companhia. A melhor companhia que já tiveram.
Peço que não me entendam mal. Não temos que procurar sofrimento. Não precisamos buscar ser mártires. Os problemas têm a tendência de nos encontrar, mesmo que não os procuremos. Mas quando é óbvio que um certo tempo na cadeia de Liberty os espera (espiritualmente falando), lembrem-se dessas duas primeiras verdades ensinadas a Joseph naquela prisão-templo. Primeiro, Deus não se esqueceu de vocês, e segundo, o Salvador esteve onde vocês estiveram, permitindo que Ele providencie sua libertação e seu conforto.
Como o profeta Isaías escreveu, o Senhor “em ambas as palmas das [Suas] mãos [os tem gravados]” (Isaías 49:16), permanentemente escritos ali, em tecido cicatricial, com pregos romanos como instrumento de escrita. Tendo pago esse preço no sofrimento que Eles pagaram por vocês, o Pai e o Filho nunca os esquecerão nem os abandonarão em seu sofrimento (Ver Isaías 49:14–16; ver também 1 Nefi 21:14–16). Eles planejaram, prepararam e garantiram sua vitória se vocês o desejarem, portanto acreditem e “[suportem] bem” (D&C 121:8). No final, “[será] para o [seu] bem” (D&C 122:7), e verão “domínio eterno” fluir para vocês eternamente “sem ser compelido” (D&C 121:46).
3. Permaneçam calmos, pacientes, caridosos e perdoadores
Em terceiro lugar, e por último esta noite, gostaria de lembrar a todos nós que, no meio desses sentimentos difíceis, quando se poderia justificadamente estar zangado, reacionário ou vingativo, querendo devolver olho por olho e dente por dente, o Senhor nos lembra, da prisão-templo da cadeia de Liberty, que
os direitos do sacerdócio são inseparavelmente ligados com os poderes do céu e os poderes do céu não podem ser controlados nem exercidos a não ser de acordo com os princípios da retidão. [D&C 121:36]
Portanto, mesmo quando enfrentamos tais circunstâncias angustiantes em nossa vida e há algo em nós que quer atacar Deus ou homem, ou amigo ou inimigo, devemos lembrar que “nenhum poder ou influência pode ou deve ser mantido em virtude do sacerdócio, a não ser com persuasão, com longanimidade, com brandura e mansidão e com amor não fingido; (…) sem hipocrisia e sem dolo” (D&C 121:41–42; grifo do autor).
Sempre foi um maravilhoso testemunho para mim da grandeza do Profeta Joseph e da grandeza de todos os nossos profetas, incluindo e especialmente o Salvador do mundo em Sua magnificência, que em meio a tal angústia e dificuldade eles conseguissem permanecer calmos e pacientes, caridosos e perdoadores – que eles pudessem simplesmente falar dessa maneira, e, ainda mais, viver dessa maneira. Mas eles podiam, e eles o fizeram. Eles se lembraram de seus convênios, se disciplinaram e sabiam que devemos viver o evangelho em todos os momentos, não apenas quando é conveniente e não apenas quando as coisas estão indo bem. Na verdade, eles sabiam que o verdadeiro teste da nossa fé e do nosso discipulado cristão é quando as coisas não estão indo bem. Isso é quando conseguimos ver do que somos feitos e quão forte é nosso compromisso com o evangelho.
Certamente, o exemplo clássico disso é que, nas horas mais dolorosas da crucificação, o Salvador conseguiu dizer: ‘Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem’ (Lucas 23:34). Isso é uma coisa difícil de pedir quando estamos sofrendo. Essa é uma coisa difícil de fazer quando somos ofendidos, ou estamos cansados ou estressados ou sofremos inocentemente. Mas é nesse momento que a conduta cristã mais importa. Lembrem: “os poderes do céu não podem ser controlados nem exercidos a não ser de acordo com os princípios da retidão”. E precisamos dos poderes do céu conosco em tais momentos! Como Joseph foi ensinado nessa prisão-templo, mesmo em angústia e tristeza, devemos deixar “que [nossas] entranhas (…) sejam cheias de caridade para com todos os homens (…) ; então [nossa] confiança se fortalecerá na presença de Deus; e (…) o Espírito Santo será [nosso] companheiro constante” (D&C 121:45–46).
Permanecer fiel aos nossos princípios cristãos é a única maneira pela qual a influência divina pode nos ajudar. O Espírito tem uma tarefa quase impossível de chegar a um coração cheio de ódio, raiva, vingança ou autopiedade. Todas essas coisas são contrárias ao Espírito do Senhor. Por outro lado, o Espírito encontra acesso instantâneo a um coração que se esforça para ser caridoso e perdoador, longânimo e bondoso – princípios do verdadeiro discipulado. Que testemunho de que os princípios do evangelho devem ser aplicados em todos os momentos e em todas as situações e de que se nos esforçarmos para permanecer fiéis, o triunfo de uma vida cristã nunca pode ser vencido, não importa quão grave seja a circunstância. Como eu amo a majestade desses elevados ensinamentos celestes, ironicamente, em um cenário e tempo tão desprezíveis.
Façam todas as coisas alegremente
Para concluir sobre as lições da Cadeia de Liberty, refiro-me ao último versículo da última seção das três às quais nos referimos esta noite. Nesta declaração final canonizada da experiência da cadeia de Liberty, o Senhor nos diz através de Seu profeta, Joseph Smith:
Portanto, amados irmãos [e irmãs, quando estamos mesmo nos momentos mais desafiadores], façamos alegremente todas as coisas que estiverem a nosso alcance; e depois aguardemos, com extrema segurança, para ver a salvação de Deus e a revelação de seu braço [D&C 123:17; grifo do autor].
Que declaração final tremendamente otimista e fiel a ser emitida de uma prisão-templo! Quando ele escreveu essas linhas, Joseph não sabia quando seria libertado ou se algum dia seria libertado. Havia toda a indicação de que seus inimigos ainda estavam planejando tirar sua vida. Além disso, sua esposa e seus filhos estavam sozinhos, assustados, muitas vezes famintos, se perguntando como eles iriam se defender sem seu marido e pai. Os Santos, também, estavam sem casas e sem seu profeta. Eles estavam deixando o Missouri em direção a Illinois, mas quem sabia quais tragédias estavam esperando por eles lá? Certamente, para dizê-lo novamente, era o mais sombrio e escuro dos tempos.
No entanto, nessas horas frias e solitárias, Joseph diz que façamos tudo o que pudermos e que o façamos alegremente. E então podemos, justificadamente, voltar-nos para o Senhor, esperar em Sua misericórdia, e ver Seu braço revelado em nosso favor.
Que atitude magnífica para manter nos bons ou maus momentos, na tristeza ou na alegria!
Bênção e testemunho
Meus queridos jovens amigos, como parte do meu testemunho final a vocês esta noite, desejo dar-lhes uma bênção. Parece-me que, enquanto nosso testemunho apostólico é levado ao mundo, temos duas oportunidades e, de fato, até mesmo obrigações. A primeira é testificar e dar testemunho, como tenho procurado fazer e em breve concluirei. A segunda é abençoar, como fizeram os antigos apóstolos quando o Salvador os convidou a fazer o que Ele próprio havia feito — porém, desta vez, em todo o mundo.
Então, para cada um de vocês presentes esta noite – aqui neste vasto auditório ou em outros locais ao redor do mundo – abençoo cada um de vocês, cada um de vocês em suas circunstâncias individuais, como se minhas mãos estivessem em sua cabeça. Ofereço isso a vocês tão honestamente quanto ofereço meu testemunho. Abençoo-os em nome do Senhor que Deus os ama, ouve suas orações, está ao seu lado e nunca os deixará.
Abençoo os irmãos, para que vocês – que nós – sejamos dignos do sacerdócio que temos, que sejamos fiéis ao discipulado para o qual fomos chamados, nessa grande ordem, o Santo Sacerdócio, segundo a ordem do Filho de Deus. Eu os abençoo para que realmente sejamos como o Mestre – que pensemos mais como Ele pensa, que falemos mais como Ele fala, e que façamos mais como que Ele fez. Abençoo-os, irmãos, enquanto se esforçam para ser fiéis, de que terão todas as bênçãos do sacerdócio, muitas das quais citamos esta noite a partir destas mesmas seções de Doutrina e Convênios.
Abençoo as irmãs que estão nesta audiência e as que estão no alcance da minha voz. Eu gostaria que vocês soubessem o quanto nós apreciamos vocês, o quanto Deus as ama, e o quanto a bandeira da fé já foi hasteada pelas irmãs desta Igreja desde o início. Em cada geração, ao que parece, desde o início dos tempos até os dias de hoje e além, muitas vezes foram as mulheres em nossas vidas – nossas avós, nossas mães, nossas esposas, nossas filhas, nossas irmãs, nossas netas – que ergueram a tocha da fé e a flâmula de uma bela vida e levaram os princípios do evangelho para onde quer que estes as levassem, contra qualquer dificuldade, em suas próprias cadeias de Liberty e tempos de dificuldade. Irmãs, nós as amamos, as honramos e as abençoamos. Pedimos que todo desejo justo de seu coração, esta noite e para sempre, seja respondido em sua cabeça e que vocês saiam deste devocional com o entendimento e o conhecimento firmemente em seu coração sobre o quanto Deus e o céu e os líderes desta Igreja as amam e as honram.
Eu os saúdo, jovens adultos desta Igreja, reunidos nesta grande congregação do SEI, e afirmo que o futuro está em suas mãos. Aqueles de nós da minha geração têm que, em um futuro muito próximo, passar o bastão para vocês. Que Deus os abençoe para enfrentarem esses tempos com o valor, a honestidade e a integridade das quais falamos aqui nesta noite.
Ao encerrar, testifico que o Pai e o Filho vivem. E testifico que Eles estão próximos, talvez ainda mais próximos através do Espírito Santo, quando estamos passando por tempos difíceis. Testifico (assim como nosso número musical de encerramento, “A Minha Benignidade Não Se Desviará de Ti”, testificará, citando o profeta Isaías) que a bondade do céu nunca se desviará de vocês, independentemente do que acontecer (ver Isaías 54:7–10; ver também 3 Néfi 22:7–10). Testifico que os maus dias chegam ao fim, que a fé sempre triunfa, e que as promessas celestiais são sempre cumpridas. Testifico que Deus é nosso Pai, que Jesus é o Cristo, que este é o evangelho verdadeiro e vivo – encontrado nesta Igreja verdadeira e viva. Testifico que o Presidente Thomas S. Monson é um profeta de Deus, nosso profeta para esta hora e dia. Eu o amo e o apoio, como sei que vocês também o fazem. Nas palavras da experiência da prisão-templo da cadeia de Liberty, meus jovens amigos, “[Perseverem] em [seu] caminho. (…) Não [temam] (…) pois Deus estará [com vocês] para todo o sempre” (D&C 122:9). Em nome de Jesus Cristo, amém.
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Notas
- Em HC 3:190–91. Citação português encontrado em Santos: Volume 1, O Estandarte da Verdade, 1815-1846, Capítulo 31; 2018.
- Alexander McRae, citado em B. H. Roberts, A Comprehensive History of the Church of Jesus Christ of Latter-day Saints: Century One [História Completa da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias: Século 1], 6 vols. (Salt Lake City: A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, 1930), 1:521.
- HC3:290.
- Carta a Isaac Galland, 22 de março de 1839, em Personal Writings of Joseph Smith,rev. ed., comp. Dean C. Jessee (Salt Lake City: Deseret Book, 2002), 456.
- Carta à Igreja no condado de Caldwell, 16 de dezembro de 1838; “Communications”, Times and Seasons, Abril de 1940, 85.
- Carta a Emma Smith, 21 de março de 1839, em Personal Writings, 449.
- Carta a Emma Smith, 4 de abril de 1839, em Personal Writings, 463, 464.
- Veja Comprehensive History,capítulo 38, cabeçalho, 1:521; ver também 526.
- Veja, por exemplo, “A Choice Seer”, Ensign, Agosto de 1986, 12.
- “Text of Address by Pres. Smith at Liberty Jail Rites”, Church News, 21 de setembro de 1963, 14; grifo do autor.
- “Deus É Consolador Sem Par” , Hinos, 1985, n. 139. O texto em inglês é diferente do que portugês.
- “Mais Perto Quero Estar”, Hinos, n. 62.

Jeffrey R. Holland era membro do Quórum dos Doze Apóstolos de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias quando este discurso foi proferido em 7 de setembro de 2008.